"Quando o pior acontecia, aquele sorriso descia às minhas trevas com um soluço de baloiço, um gingar de gonzos arrancado às cordas da infância. Eu sentava-me nele e subia, balouçando, até à luz."
"Ninguém mais vai estar à minha espera, não terei de me disfarçar de desculpas, não voltarei a iludir ou desiludir ninguém."
"(...) essa gargalhada póstuma destoaria do meu belo arquivo de gargalhadas tuas. Estragava-lhe a estética, entendes?"
"Como sabes, eu vivo por relâmpagos, contigo partilhei uma trovoada um pouco mais longa do que o habitual. Foi apenas isso."
"(...) o meu olhar sem órbitas move-se por ampliações máximas de pormenores mínimos."
"- Vê-se tão bem quem joga com tudo o que é e quem joga só com o corpo, dizias tu."
"De repente, estava quase velho – como toda a vida me apetecera ser. Com direito a resmungar, a jorrar sentenças e lançar ralhetes, a ter razão respeitada de quem já não espera ter mais nada. E vi-me esvaziado, sem perceber porquê. Com vontade de resmungar sem razão, de sentenciar sem sentido. De experimentar de novo a arrogância aflita da juventude."
"Há tantas coisas que nunca te disse – e dizias tu que eu falava demais. Flutuo por este noante em busca dessas palavras a menos, atravessadas entre nós como um longo corredor de prisão. (...) não te perdoo o que não soubeste saber de mim. (...) não me perdoo o que não soube verter-te de mim."
"É verdade que não paravas de falar. Mesmo ou sobretudo sem palavras, com o movimento do teu corpo, a força dos teus abraços em carne viva."
"Fazes-me falta, merda – já te disse?"
"Tanto que eu queria agora dar-te o amor total e infantil que tinha para te dar. Racionei-o a vida inteira como a porra de um chocolate de leite – por que vivemos como se o tempo nos pertencesse infinitamente, como se pudéssemos repetir tudo de novo, como se pudéssemos alguma coisa?"
"Eu usava a música como banda sonora, canções feitas à medida de cada estado de alma (...)."
"Há uma energia ética nos funerais. Um desespero pelo bem que lança pó de estrelas nos olhos e apaga os pequenos ressentimentos quotidianos. Amanhã voltaremos a invejar-nos uns aos outros. A maldizer o próximo pela calada. A trair grandes amigos em pequenos cafés de negócios. A ser bonzinhos só de vez em quando."
"Quando as coisas deixam de durar, alteram-se. O simples facto de deixarem de ser altera-se, por mais que procuremos fazê-las estancar."
"Todos os filhos nascem póstumos de um amor que já não flutua no ar que respiram. Tentativas, tentações de ampliar o conhecimento da vida, quando a vida só se deixa conhecer pela porta escura da ignorância, do desentendimento."
"Há quanto tempo não me arde o coração?"
"Sempre fui nostálgica, sobretudo do que não chegou a acontecer. Dos deslumbramentos a haver."
"Enganam e consolam, as palavras. Como a seda."
"Morri tantas vezes antes de morrer – morri sempre que o amor parava, e o amor estava sempre a parar dentro de mim. Parava e crescia, comia tudo o que eu sabia."
"Consolamo-nos na beleza imediata das coincidências, escapa-nos a beleza catastrófica dos acasos."
"Ainda terei tempo para te esquecer? O teu riso em carrossel, é esquecível?"
"Demasiado tarde. São estas as palavras mais tristes de qualquer língua."
"Todos nós saltamos de galho em galho como pardais, poucos ousam o voo picado das águias. Faz-me falta essa tua ousadia (...)."
"Tão efémeras, as cumplicidades radiosas. Encontros de pele, de ideias, de atmosferas, (...)."
"Ninguém é capaz de descrever a curva dos teus dedos (...)."
"A dor precisa de um corpo. Limites de pele, unhas, ranho, suor. A incapacidade de sair, a coragem irremediável de viver o tempo. Paciência, peso, cérebro ardendo."
"Terei saudades de ti, ou da inocência que eu tinha quando te conheci?"
"E o teu cheiro. Ofereci o perfume que usavas a uma amiga minha. Ela usou-o, e não era o mesmo. Deixei-a e vim para casa chorar o teu corpo irrepetível."
"Só vivendo sobre a mudança se podia evitar a dor, só contornando a monstruosa perfeição do tempo se podia vencê-lo. Assim pensava, e enganei-me, porque o tempo não é pensável."
"Separados, éramos muito mais úteis ao extremoso grupo de amigos que criáramos do que juntos, cintilantes e perigosos como um par de amantes. Os seres que criáramos precisavam de nos matar para sobreviver. E nós deixámo-nos matar, porque está na natureza do amor estilhaçar-se sem ruído, desfazer-se em vidros e pesar-nos (...)."
"Tudo o que tocamos se desfaz. Depois fica-nos o vício da decomposição, o perfume intoxicante das coisas mortas."
"Encontrámo-nos demasiado cedo numa civilização descrente de encontros definitivos. Entendíamo-nos inteiramente."
"(...) terei chegado a dizer-te que essa transparência seduzia infinitamente mais do que todos os sobrepostos véus das divas que invejavas?"
"Sentia uma vontade violenta de me desmoronar em ti. Não, não era fazer amor. Fazer amor não existe, porra, o amor não se faz. O amor desaba sobre nós já feito, não o controlamos (...)."
"Durante muitos meses apenas nos víamos. Não nos olhávamos. Até que veio ter connosco aquele momento."
"Sabes que começo a esquecer o som do teu riso?"
"Terás alguma vez entendido que o bem que eu queria para mim era só o de ser quem era?"
"Sei tão pouco de ti."
"Foi sem querer. Se deixei de te comover, de te divertir, de te inspirar, (...) foi sem querer. Se perdi a capacidade de te ferir e fazer sangrar, foi sem querer. Foi sem querer que te copiei, para não te perder, para não perceberes que eu se calhar não era capaz."
"A vida consiste nisso mesmo: em que nos usemos, da melhor maneira que pudermos. Usei-te eu como devia? Porque me sobras tanto, ainda?"
Inês Pedrosa
6 comentários:
Tanta frase gira, mas houve uma que me chamou a atenção:
"Fazes-me falta, merda – já te disse?"
Quem é que pode sentir a falta de tal coisa?!?
=)
Um abraço!
depois de ler cada uma das frases ficou a vontade de comentar especialmente umas quantas. Mas mais "estranho" que isso fica a pergunta: o que te levou a postar tantas frases sobre assuntos tão díspares?Cheira-me a puzzle:P
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Eu não me posso queixar.
Dizes-me seempre presente quando eu preciso!
Bem hajas!
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Beijinhos
são apenas as frases q sublinhei... por algum motivo :)
(e ficaram mtas de fora!)
"Encontrámo-nos demasiado cedo numa civilização descrente de encontros definitivos. Entendíamo-nos inteiramente."
Este é, desde há muito, um dos meus maiores medos...
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