segunda-feira, março 06, 2006

Quem fala assim (1)

Admito que deveria ler jornais com mais regularidade.
Apenas a Visão me faz quebrar esse (não) hábito.

Já este fim-de-semana resolvi fugir à regra.
Comprei o DN e o Expresso.
Mas só hoje consegui ler a Única (revista do semanário).

Eis algumas coisas que gostei de ler...


"Tinha é pior que morrinha

A «morriña» da Galiza é uma saudade que eles de lá têm e a morrinha brasileira é preguiça, é «quebreira». Ambas são irmãs da nossa, que não vai tão longe mas tem a sua particularidade. A morrinha portuguesa não mata mas mói. (...)
A nossa morrinha está entre a moinha e a morte. (...)
A morte, mais suas glórias e toiros, é lá com os espanhóis. Em Portugal ficamo-nos pela moagem. (...) Sobretudo, fazemos questão de distinguir entre tinha e morrinha. Tinha é sarna; morrinha cantava a Amália, não obstante Júlio Iglésias.
(...) As moinhas são dorzinhas com duas pequenas vantagens e uma grande desvantagem. As vantagens são que não são importantes e nunca doem muito. A desvantagem é que doem sempre. (...)
A morrinha portuguesa é uma forma de tirar o efeito-surpresa à morte.
Em vez de viver, vai-se morrendo. (...)
Os portugueses deixam-se moer para não se deixarem matar. Andam permanentemente enfermiços, não vá dar-se o caso de adoecerem de repente. (...)
(...) os portugueses montaram um vago sentimento que tem um pouco de todas essas emoções mas não corre riscos. É a morrinha; a moinha; a pequena enxaqueca na moleirinha. (...)
Pode-se ou não se pode então dizer que acaba por ser uma celebração da vida, por muito macambúzia e aborrecida que possa ser, este estranho comportamento que significa ser a morte afinal a tal coisa que, como quem não quer a coisa, não se quer? Pode-se? Não sei, não me queria meter nisso, não tenho andado nada bem."

COMO QUEM DIZ, Miguel Esteves Cardoso

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